quinta-feira, 8 de abril de 2010

Apesar da existência de algumas excepções, não há, no entanto, na obra da maioria dos paisagistas do século XX, uma decisão marcada entre um ou outro tipo de vegetação (espontânea ou exótica). O problema, aliás, não é simples. Existem variadíssimos casos de espécies cuja introdução remonta a períodos muito recuados no tempo, pelo que, para além de se encontrarem perfeitamente aclimatadas, reflectem a história e a cultura característica de uma determinada região. De facto, estas espécies possuem um valor de tradição que torna insensata a sua exclusão do jardim apenas pelo facto de não serem espontâneas. No entanto, não é simples estabelecer um conjunto de critérios que possam presidir à determinação de qual deva ser a vegetação a considerar como tradicional (3). A antiguidade, o grau do impacto cultural e as afinidades com a vegetação autóctone, são alguns dos argumentos que podem legitimar a inclusão nesta categoria, todavia, eles deixam uma grande margem a dúvidas, já que não permitem estipular quaisquer critérios exactos generalizáveis a todas as plantas.

Gilles Clément (2001) considera a este respeito que as espécies introduzidas, perfeitamente adaptadas às condições locais, que hoje se desenvolvem e reproduzem espontaneamente a par das verdadeiras espontâneas – espécies subespontâneas -, fazem parte integrante das séries florísticas actuais, pelo que não há qualquer razão para a sua exclusão do jardim.

Para além disto, a história demonstra-nos que atitudes demasiado rígidas para com escolha do tipo de vegetação a empregar no jardim resultam, muitas vezes, numa perda de diversidade tanto biológica como cultural. De facto, a obsolescência temporária das plantas, motivada pela mudança das “modas de plantação”, levou já à escassez, e mesmo ao desaparecimento, de inúmeras cultivares de flor de características seleccionadas (floração longa, flores e folhas maiores, vigor e adaptabilidade geral), cultivadas no jardim ao longo de séculos (4) (HOBHOUSE, 1997). No século XX, este fenómeno verificou-se aquando do abandono dos modelos formais de cultivo em canteiros de plantas de estação, na moda até ao início da Primeira Guerra Mundial (em 1914) (HOBHOUSE, 1997). No período que se sucedeu, e até ao recente ressurgimento de interesse por composições de carácter mais formal, os jardineiros municipais foram praticamente os únicos a assegurar que um espectro razoável deste tipo de plantas fosse perpetuado (o número de espécies hoje disponível é, no entanto, muito reduzido quando comparado com o número de espécies presentes nos catálogos dos viveiros vitorianos) (HOBHOUSE, 1997).

Actualmente, um conhecimento e uma sensibilidade mais profundos a respeito da vegetação permitem-nos, com maior consciência, discernir do seu valor ecológico e cultural. A tendência é, todavia, para que cada vez mais seja reconhecida a importância do papel da vegetação espontânea na linguagem vegetal do jardim.

(3) O conceito de vegetação tradicional é aplicado por Caldeira Cabral para designar a vegetação que, não sendo espontânea, é há muito cultivada numa dada região, integrando por isso a sua cultura e história.
(4) Existem actualmente diversas entidades (como o Nacional Council for the Conservation of Plants and Gardens, na Inglaterra, e sociedades americanas especializadas, como a Thomas Jefferson Memorial Foundation em Monticelo) que se dedicam à pesquisa e à conservação das cultivares antigas, procuradas, em particular, para os restauros periódicos dos jardins históricos Europeus e Norte Americanos (HOBHOUSE, 1997).

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